Cerrado sofre com desmatamento e uso intensivo da água

Segundo maior bioma da América do Sul, presente em cerca de 22% do território brasileiro, o Cerrado é considerado a savana com maior biodiversidade no planeta. Apesar de sua importância estratégica para a conservação da natureza no Brasil, o bioma ainda é pouco reconhecido e valorizado pela população, além de sofrer o desmatamento acelerado e uso intensivo de seus recursos naturais, especialmente pela expansão da fronteira agrícola, colocando em risco algumas das principais bacias hidrográficas do país. No último domingo (11 de setembro) foi celebrado o Dia Nacional do Cerrado, saiba mais sobre a importância do bioma e conheça algumas de suas principais ameaças.

De acordo com o Sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Cerrado perdeu mais de quatro mil quilômetros quadrados de áreas naturais de janeiro a julho deste ano, um aumento de 28% em relação ao mesmo período de 2021. Foi o maior índice de desmatamento acumulado para os primeiros sete meses do ano desde 2018.

Os dados do Inpe revelam que o desmatamento tem sido maior na região conhecida como Matopiba — Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia –, território de maior expansão da fronteira agrícola no país. “Tratar o Cerrado meramente como “celeiro do país”, sem entender que temos um bioma único com enorme potencial para o desenvolvimento sustentável, é simplesmente queimar o nosso futuro”, alerta Reuber Brandão, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor de Manejo de Fauna e de Áreas Silvestres na Universidade de Brasília (UnB).

O pesquisador entende que o protagonismo da produção de soja no Cerrado é um modelo reducionista, com pouco valor agregado, que depende da ocupação de grandes territórios para ser viável. “Isso ocorre em detrimento de um potencial enorme de tornar o bioma uma potência biotecnológica, com o desenvolvimento de medicamentos, cosméticos, alimentos, produtos biotecnológicos, entre outras possibilidades. Infelizmente, não percebemos a mesma comoção da sociedade brasileira com as perdas ecológicas do Cerrado como vemos com outros biomas. Precisamos conhecer melhor todo o potencial deste bioma, inclusive para ampliar o turismo sustentável”, reflete Brandão.

O Cerrado possui cerca de 12 mil espécies de plantas e mais de 2,5 espécies de animais catalogados, entre aves, mamíferos, peixes, répteis, anfíbios e invertebrados. O bioma também abriga oito das 12 principais bacias hidrográficas do Brasil, como as nascentes dos rios São Francisco e Paraná. “A perda da vegetação já interfere – e muito – na disponibilidade hídrica em todo o território. Isso deve causar problemas de abastecimento de água para as cidades, para a geração de energia elétrica e, também, para a produção agrícola. Portanto, os próprios produtores devem ser os maiores interessados na conservação”, observa o pesquisador.

Para o especialista, para que seja possível conhecer todo o potencial biotecnológico do Cerrado, é necessário proteger as áreas naturais remanescentes, por meio da criação de unidades de conservação, tanto públicas quanto particulares. “Também é fundamental criar mecanismos para que os proprietários de terras sejam remunerados por serviços ambientais ao manterem áreas naturais protegidas”,sugere Brandão.

De acordo com dados do Mapbiomas, mais de 50% da vegetação original do Cerrado já foi perdida. “Se a ocupação do território não for feita de forma planejada, teremos grandes perdas para toda a coletividade. É importante lembrar que os serviços ecossistêmicos providos pela natureza beneficiam toda a população e não podem estar a serviço de apenas uma parte dela”, afirma o pesquisador.

Sobre a Rede de Especialistas

A Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) reúne cerca de 80 profissionais de todas as regiões do Brasil e alguns do exterior que trazem ao trabalho que desenvolvem a importância da conservação da natureza e da proteção da biodiversidade. São juristas, urbanistas, biólogos, engenheiros, ambientalistas, cientistas, professores universitários – de referência nacional e internacional – que se voluntariaram para serem porta-vozes da natureza, dando entrevistas, trazendo novas perspectivas, gerando conteúdo e enriquecendo informações de reportagens das mais diversas editorias. Criada em 2014, a Rede é uma iniciativa da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza. Os pronunciamentos e artigos dos membros da Rede refletem exclusivamente a opinião dos respectivos autores.

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