Para Guedes, pobreza é maior inimiga do meio ambiente — não é bem assim

São Paulo — Paulo Guedes, ministro da Economia, disse nesta terça-feira (21) em painel do Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, que a pobreza é o maior inimigo do meio ambiente.

Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, falou algo semelhante em dezembro: “Temos que encontrar a origem (do aumento do desmatamento), que está entre outras razões, na falta de desenvolvimento econômico sustentável para os mais de 20 milhões de brasileiros que vivem lá [na Amazônia].”

Para especialistas, no entanto, a relação não faz sentido, pois o desmatamento para fins de subsistência representa uma porcentagem pequena perto da devastação em curso na Amazônia.

“O desmatamento que ocorre hoje em maior intensidade está na fronteira agropecuária do Brasil, lideradas por produtores rurais. Para desmatar a Amazônia, é preciso dinheiro, queimar em larga escala mesmo é difícil, devido à umidade da região”, diz o economista Daniel Duque.

O custo de atear fogo em uma área de mil hectares chega perto de R$ 1 milhão, segundo cálculos do Ministério Público Federal.

Ao mesmo tempo, associar o modo de vida dos povos florestais com a miséria é um erro, segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), organização não governamental que trabalha pelo desenvolvimento da região.

“É claro que todos se beneficiam com uma melhora nas condições de saúde e educação, mas miséria mesmo encontramos nas grandes cidades”, afirma Ane Alencar, diretora de Ciência do Ipam. Segundo ela, sem a floresta, a miséria seria ainda maior para os povos da Amazônia.

A fala do ministro Paulo Guedes, de que a pobreza é a maior inimiga do meio ambiente, deve ser melhor contextualizada, segundo a diretora.

“Isso pode valer para alguns países, mas não vale para a Amazônia”, diz ela. “A floresta é uma grande fonte de recursos para seus habitantes. É ela que garante a subsistência. Quem desmata o faz para lucrar com a produção de alimentos ou com a especulação imobiliária.”

Dados do Ipan indicam que, entre janeiro e agosto do ano passado, as propriedades privadas concentraram 33% dos focos de fogo e 28% do desmatamento registrados pelo sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que monitora as queimadas na Amazônia.

Essas propriedades representam 18% da área total ocupada no bioma. As áreas indígenas, por outro lado, que representam 25% do total, foram responsáveis por cerca de 6% dos focos de queimadas e 4% do desmatamento.

Exame