Noruega vai reatar investimento contra o desmatamento

Criado em 2008 para apoiar iniciativas em prol da redução do desmatamento, o Fundo Amazônia conta com a ajuda financeira de diversos países. Porém, em 2019, no início da gestão de Jair Bolsonaro, tanto a Noruega como a Alemanha, congelaram os recursos. Nesta segunda-feira (31), confirmada a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro de Meio Ambiente da Noruega, Espen Barth Eide, afirmou à AFP (Agence France-Presse) que retomará o investimento.

“Nós observamos que durante a campanha ele [Lula] enfatizou a preservação da floresta amazônica e a proteção dos povos indígenas da Amazônia. Por isso, estamos ansiosos para entrar em contato com suas equipes, o mais rápido possível, para preparar a retomada da colaboração historicamente positiva entre Brasil e Noruega”, afirmou Espen Barth Eide à AFP.

Segundo o jornalista e correspondente na Europa Jamil Chade, a notícia também foi confirmada à imprensa norueguesa. “Há quantias significativas congeladas em uma conta no Brasil no Fundo Amazônia, que podem ser desembolsadas rapidamente”, disse Barth Eide, em entrevista à agência de notícias local NTB.

O valores disponíveis para o fundo de proteção ao bioma amazônico giram em torno de cinco bilhões de coroas norueguesas (cerca de 2,5 bilhões de reais), segundo declarou o ministro à AFP.

Ainda nesta segunda-feira (31), Jonas Gahr Støre, primeiro-ministro da Noruega, publicou em seu Twitter que agora “novas possibilidades se abrem para o Brasil – e para o importante papel que desempenha nos assuntos globais, e uma nova esperança para nossos esforços comuns de combate às mudanças climáticas”. Na mesma rede social, Barth Eide afirmou que a Noruega espera revitalizar a “extensa parceria climática e florestal com o Brasil”.

Contexto

Ocupando a maior parte do território nacional, a Amazônia é um território diverso, lar de 30 milhões de pessoas. Por isso, além das ações de proteção à floresta, diversas organizações nasceram ali para apoiar o desenvolvimento sustentável da região. A comercialização de produtos sustentáveis de base florestal é exemplo de ações realizadas neste sentido.

O Fundo Amazônia surge para captar doações justamente para investimentos em ações de prevenção, monitoramento, combate ao desmatamento e de promoção ao uso sustentável das florestas amazônicas.

Brasil e Noruega haviam estabelecido o maior fundo de cooperação internacional durante o governo Lula, seriam mais de US$ 1 bilhão. Sendo o maior doador, o governo da Noruega doou US$ 41,8 milhões ao Fundo Amazônia em 2017. Na época, o Brasil apresentou os índices de desmatamento na região que caíram 12% em relação a 2016.

Em 2018, porém, o desmatamento na Amazônia voltou a crescer. Entre 2018 a 2019, o aumento foi de quase 30%, o que foi escalando nos anos seguintes até batermos recordes seguidos de desmatamento no bioma.

De todo modo, o que motivou, inicialmente, o congelamento dos recursos por parte da Alemanha e Noruega foi a tentativa do governo federal em mudar as regras do Fundo Amazônia.

Tudo começou após Ricardo Salles, então ministro do Meio Ambiente, questionar supostas irregularidades na gestão do fundo realizado pelo BNDES e das ONGs favorecidas, o que foi refutado por ambos países. Na época, diversas organizações não-governamentais que atuam na Amazônia vieram a público explicar o processo minucioso pelo qual se dá a aprovação de qualquer projeto pelo Fundo.

“A aprovação desses projetos se dá por meio de um processo técnico, objetivo e transparente. Todos os projetos tiveram que desenvolver argumentos e lógicas de intervenção baseadas nas estratégias e eixos temáticos definidos pelo Governo Brasileiro (por meio do Fundo Amazônia e o Ministério do Meio Ambiente) e integradas às políticas públicas municipais, estaduais e federais”, afirmou uma declaração conjunta de diversas entidades ambientais em agosto de 2019 – saiba mais aqui.

Alemanha e Noruega também saíram em defesa do trabalho realizado até então, apontando a transparência das contas. “Anualmente, a gestão do Fundo do BNDES é sujeita a auditorias financeiras e avaliações de impacto, conduzidas de acordo com padrões internacionais. Até agora, essas auditorias e avaliações foram unânimes no seu reconhecimento geral do uso eficiente dos recursos e de impactos mensuráveis de redução do desmatamento do Fundo Amazônia”, afirmou uma carta de resposta da Alemanha e Noruega, publicada com exclusividade pelo jornalista André Trigueiro.

Na época, a Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES) levantou a hipótese de que a intenção de Salles era a utilização dos recursos do Fundo para pagar indenizações relacionadas à desapropriação de terras por razões de preservação ambiental, o que iria beneficiar grileiros, que invadem áreas de preservação na intenção de receber indenizações. “Entre os planos do ministro estava desacreditar o corpo técnico do BNDES e obter o controle do Fundo”, afirmou a associação.

Mesmo com a repercussão negativa, o governo federal suspendeu a diretoria e o comitê técnico do Fundo Amazônia. A Alemanha então foi a primeira a suspender as contribuições, congelando R$ 155 milhões, e em seguida a Noruega bloqueou o repasse de R$ 132,6 milhões. Esperava-se que novas propostas para a continuidade do fundo surgissem, mas, além disso não ocorrer, a escalada do desmatamento na Amazônia foi piorando ano a ano.

De 2019 a 2021 – a taxa anual de 2022 do Prodes ainda não foi divulgada – a gestão de Bolsonaro consolidou uma alta de 73% no desmatamento na Amazônia Legal, segundo dados oficiais do Prodes, Projeto para o mapeamento oficial das perdas anuais de vegetação nativa na Amazônia Legal, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

CicloVivo